domingo, 29 de julho de 2012

"Fidel, a história não contada" (2001), documentário dirigido por Estela Bravo


Fidel, visto por Estela Bravo from Guevaristas on Vimeo.

"No final, as pessoas terão que reconhecer que fomos firmes... Que defendemos nossas convicções... Defendemos nossa independência e quisemos fazer justiça... Que fomos rebeldes. E se David é recordado porque lutou contra Golias... E os cubanos, que constituímos um David muito menor, contra um Golias muito maior... Terão que lembrar de nós tanto quanto se recorda de David." - Fidel Castro


quarta-feira, 25 de julho de 2012

O general francês que veio ensinar a torturar no Brasil



 “A tortura é eficaz, a maioria das pessoas não aguenta e fala. Depois, na maioria dos casos, nós os matávamos. Por acaso isso me colocou problemas de consciência? Não, a verdade é que não” - general francês Paul Aussaresses, ex-adido militar francês no Brasil (1973-1975).


O general francês Paul Aussaresses, promotor do uso da tortura na guerra colonial da Argélia, foi adido militar no Brasil entre 1973-1975 e instrutor no Centro de Instrução de Guerra na Selva (CIGS), em Manaus, criado por oficiais brasileiros formados na não menos famosa Escola das Américas. Amigo do ditador João Figueiredo e do delegado Sérgio Fleury, Aussaresses já admitiu em livros e entrevistas a morte de um mulher sob tortura em Manaus, que teria vindo ao Brasil para espionar Figueiredo, e que a ditadura brasileira participou ativamente do golpe contra Allende. O artigo é de Eduardo Febbro.
Eduardo Febbro – Paris
22.7.2012

Paris - “A tortura é eficaz, a maioria das pessoas não aguenta e fala. Depois, na maioria dos casos, nós os matávamos. Por acaso isso me colocou problemas de consciência? Não, a verdade é que não”. O autor dessa “confissão” é uma peça-chave da estratégia repressiva de prisões, torturas e desaparecimentos aplicada no sul da América Latina a partir dos anos 70. Trata-se do general francês Paul Aussaresses, ex-adido militar francês no Brasil (1973-1975), chefe do batalhão de paraquedistas, ex-combatente na Indochina, ex-membro da contra espionagem francesa, herói da Segunda Guerra Mundial, fundador do braço armado dos serviços especiais, promotor do uso da tortura durante a guerra colonial na Argélia e, sobretudo, instrutor das forças especiais norte-americanas em Fort Bragg, o famoso centro de treinamento da guerra contra insurgente, e no Centro de Instrução de Guerra na Selva (CIGS), em Manaus, criado por oficiais brasileiros formados na não menos famosa Escola das Américas, onde se formaram todos os militares latino-americanos que cobriram de sangue os anos 60, 70 e 80.

Paul Aussaresses é uma das espinhas dorsais da exportação da tortura e dos desaparecimentos, dois modelos herdados da guerra da Indochina a da Argélia e difundidos depois em todo o continente americano por um compacto grupo de oficiais francesas do qual Aussaresses foi um dos mais ativos representantes. Paul Aussaresses abriu muitos de seus segredos em várias ocasiões: em 2000, em uma explosiva entrevista publicada pelo Le Monde, onde reconheceu o uso da tortura; em três livros, “Não disse tudo, últimas revelações a serviço da França” (2008), “Serviços especiais, Argélia 1955-1957, meu testemunho sobre a tortura” (2001), “Por França, serviços especiais 1942-1954” (2001); e ainda em um documentário filmado em 2003 por Marie-Monique Robin, “Esquadrões da Morte, a escola francesa” (ver vídeo acima).

O fio condutor desta internacional da tortura da qual Aussaresses é um dos braços começa na Indochina, segue na Argélia e termina com o Plano Condor, cuja gestação, através de uma longa série de reuniões entre os militares da América do Sul e os instrutores franceses, se gestou entre 1960 e 1974. Sua primeira estrutura se chamou Agremil. O general francês expandiu pelo mundo os ensinamentos de um dos papas da guerra moderna: o tenente coronel Roger Trinquier, o maior teórico da repressão em zonas urbanas: torturas, incursões noturnas, desaparecimentos, busca da informação por todos os meios, operações de vigilância, divisão das cidades em zonas operacionais.

Em seus anos de adido militar no Brasil, Paul Aussaresses foi, segundo suas próprias palavras, um “bom amigo” de João Baptista Figueiredo, ex-ditador e ex-chefe dos serviços secretos, o SNI, e também de Sérgio Fleury, chefe dos “esquadrões da morte”.

Em seu período como instrutor no CIGS, em Manaus, ensinou aos oficiais brasileiros e latino-americanos que faziam formação ali tudo o que havia feito na Argélia. Segundo o general francês o embaixador francês daquela época, Michel Legendre, estava perfeitamente a par do que ele fazia em Manaus.

Segundo precisou Aussaresses, no CIGS se formaram “oficiais brasileiros, chilenos, argentinos e venezuelanos porque era um centro único na América Latina”. Como prova disso, no documentário de Marie-Monique Robin “Esquadrões da Morte, a Escola Francesa”, o chileno Manuel Contreras, chefe da DINA, reconheceu ter enviado a cada dois meses contingentes inteiros de agentes da DINA para o centro de treinamento brasileiro em Manaus. Paul Aussaresses também trabalhou na Escola de Inteligência de Brasília, onde formou muitos oficiais.

Entrevistado pela Folha de São Paulo em 2008, o general se mostrou mais loquaz do que quando o juiz francês Roger Leloir o interrogou a propósito de seu conhecimento do Plano Condor e das atividades dos conselheiros militares franceses na Argentina, Uruguai, Paraguai e Brasil. Na entrevista à Folha de São Paulo, Aussaresses reconhece que o Brasil participou ativamente do golpe militar contra o presidente chileno Salvador Allende mediante o envio de armas e aviões. Também evoca o que já havia contado em seu último livro, “Não disse tudo, últimas revelações ao serviço da França”, a saber, a morte sob tortura, em Manaus, de uma mulher que, segundo João Figueiredo, havia vindo ao Brasil para espioná-lo. O general francês assegura que a morte daquela mulher foi “um ato de defesa”.

Para Aussaresses, “a tortura se justifica se pode evitar a morte de inocentes”. Aussaresses não foi o único militar de alta patente que confessou o recurso sistemático da tortura durante a guerra colonial da Argélia e, particularmente, no que ficou conhecido como “A Batalha de Argel”. Esses episódios de tortura foram amplamente narrados pelo jornalista e político franco-argelino Henri Alleg em vários livros, entre eles “Guerre d’Algérie: Mémoires parallèles”. O que Alleg conta ocorreu quando o general Jacques Massu foi enviado para a Argélia e começou a aplicar a estratégia do terror. Massu foi o segundo oficial a confessar o que mais tarde se expandiria pelo sul da América.
Tradução: Katarina Peixoto

A batalha de Argel na América do Sul
Os choques elétricos, os métodos de interrogatórios, os sequestros em plena noite, a tortura sistemática, a guerra psicológica, os desaparecimentos e os voos da morte são técnicas que foram transmitidas pelos oficiais franceses aos militares sulamericanos. O cérebro destas doutrinas foi o coronel Roger Trinquier (foto). Professor na Escola das Américas dos EUA, Trinquier é o maior ideólogo francês da guerra suja cujo lema principal, a partir dos anos 50, foi que “a tortura é um elemento importante na guerra moderna contrarrevolucionária”. O artigo é de Eduardo Febbro, direto de Paris.
Eduardo Febbro – Paris
21.7.2012

Paris - “Uma vez na habitação e com a ajuda dos oficiais, agarramos Bem M’Hidi e o penduramos de tal maneira que pudesse parecer um suicídio”. A prosa do veterano general Paul Aussaresses não brilha pela originalidade, mas sim por sua precisão quando descreve as múltiplas ações ilegais que ele e seus homens protagonizaram na Argélia. A cena exposta aqui detalha o assassinato de um dos responsáveis do FLN argelino e não é mais que uma gota d’água na extensa descrição dos assassinatos premeditados organizados por oficiais do exército francês: torturas, execuções sumárias, assassinatos disfarçados de suicídios, matança de civis e utilização de helicópteros para jugar pessoas detidas com vida na Baía de Argel são moeda corrente ao longo de seu livro “Serviços Especiais, Argélia 1955-1957”.

O militar francês foi julgado por apologia da tortura. Sua história, sua passagem pelo Centro de Instrução de Guerra na Selva (CIGS) de Manaus como instrutor se nutrem de um passado, de duas guerras, Indochina e Argélia, e de quatro personagens centrais que, a partir de meados dos anos 50, alimentaram com suas teorias contrarrevolucionárias os militares da América do Sul. O “ensino” começou na Argentina a partir dos anos 50. O primeiro contato entre os exércitos da França e da Argentina ocorreu no ano seguinte à queda do general Perón, em 1957. O coronel argentino Carlos Rosas, recém-egresso da Escola de Guerra de Paris, posteriormente subdiretor da Escola de Guerra de Buenos Aires, criou um ciclo de estudos sobre “a guerra revolucionário comunista”. Foi neste marco que chegaram a Argentina os tenentes coronéis François-Patrice Badie e Patrice de Naurois.

Uma nota do futuro chefe da Polícia Federal argentina sob a ditadura de Videla, o general Ramón Camps, ilustra a importância dos dois visitantes: “seus cursos – escreve Camps – estavam diretamente inspirados na experiência francesa na Indochina e aplicada neste momento na Argélia”.

Em setembro de 1958, o ministro francês da Defesa, Pierre Guillaumat, autorizou que 60 soldados argentinos que haviam seguido esses cursos especiais fossem a Argélia, em plena guerra, em “viagem de estudos”. Outros 60 soldados viajaram no mesmo ano com destino a Paris e, em 1960, a cooperação entre exércitos deu lugar à criação de uma missão militar francesa permanente na Argentina. Composta por três oficiais superiores, sua missão consistia em “aumentar a eficácia técnica e a preparação do exército argentino”.

Nesse mesmo ano, Pierre Messmer, ministro da Defesa, enviou a Buenos Aires o chefe do Estado Maior do Exército, general André Demetz, e o coronel Henri Grand d’Esson. D’Esson é um personagem chave: foi que ele que realizou na Escola de Guerra de Buenos Aires a célebre conferência na qual descreve cada um dos aspectos da guerra subversiva e, sobretudo, o papel central do exército no controle “social da população e na destruição das forças revolucionárias”. Esse texto de 22 páginas foi publicado sob o título “Guerra Subversiva” na Revista da Escola Superior de Guerra, nº 338, Julho-Setembro de 1960. Todas essas ideias, viagens e experiências trocadas desembocarão numa espécie de cooperação continental baseada na dupla experiência dos franceses e dos argentinos.

Assim, em julho de 1961, o general Spirito, chefe do Estado Maior argentino, propôs a seus colegas da Conferência dos Exércitos da América a criação de um Curso Interamericano de luta antimarxista que seria ministrado por um ex-aluno argentino da Escola de Guerra de Paris, o coronel López Aufranc. Um total de 39 oficiais, representando 13 países, incluindo os EUA, assistiram a esses cursos. Em uma mensagem enviada à chancelaria francesa, o embaixador francês na Argentina explica: “cabe assinalar a presença de militares norteamericanos em um curso onde se deu um espaço importante ao estudo da luta anti-marxista em um espírito e segundo os métodos baseados na experiência do exército francês”.

Daí ao Plano Condor há uma rota sem obstáculos na qual se mesclam Videla, presente às aulas onde estavam os instrutores franceses, e o plano Conintes (Comoção interna do Estado). Entre 1963 e 1973 houve uma interrupção na colaboração francesa mas esta foi retomada a pedido dos argentinos.

Nos anos 70 abre-se um novo capítulo. A França mandou a Buenos Aires o coronel Pierre Servant, ex-comandante da Indochina e da Argélia, especializado em “interrogatórios”. Em abril de 1974, Servant se encontrou em Buenos Aires com um dos atores do golpe de 76, o tenente coronel Reynaldo Bignone. Servant, que negou quase todos os fatos quando a justiça francesa o interrogou há alguns anos, trabalhou no Escritório nº 3, situado no 12º andar do quartel general do Exército argentino e deu cursos nessa sede e nas províncias. Sem ligações com a embaixada francesa, Servant estava vinculado ao Secretariado Nacional da Defesa Nacional (SGDN), organismo controlado então pelo novo primeiro ministro e ex-presidente francês Jacques Chirac.

Bussi, Videla, Bignone, Vilas, Harguindeguy, todos estiveram em contato com Servant, beberam a cultura da tortura francesa e absorveram os livros teóricos de Trinquier como se fossem água benta. Servant deixou a Argentina em outubro de 1976, Aussaresses foi para o Brasil em pleno golpe de Estado.

O Plano Condor já estava em marcha. Uma nota de Henry Kissinger (ex-secretário de Estado dos EUA) distribuída nas embaixadas norte-americanas da Europa adverte que o grupo “murder” (assim era denominado o Plano Condor) operaria na velho continente, especialmente em Paris. A sede argentina do dito plano, o Centro Piloto, estava localizada no nº 83, da Avenida Henry Martin.

O cérebro destas doutrinas é o coronel Roger Trinquier. Professor emérito na Escola das Américas dos EUA, Trinquier é o maior ideólogo francês da guerra suja cujo sermão principal foi assegurar a partir dos anos 50 que “a tortura é um elemento importante na guerra moderna contra revolucionária”. A maior parte da estrutura “anti-revolucionária” foi elaborada por Trinquier. Os historiadores da Guerra da Argélia e da Indochina, que estabeleceram os nexos entre as práticas aplicadas durante esses conflitos e as que se viram depois na Argentina, Uruguai, Chile e Brasil tiram uma clara conclusão: o aperfeiçoamento do choque elétrico, a radiografia das agendas dos detidos, os sequestros em plena noite, a tortura sistemática, a guerra psicológica, os desaparecimentos, o uso de arquivos e os voos da morte são técnicas transmitidas pelos oficiais franceses.

Em um artigo de 4 de janeiro de 1981, publicado pelo diário argentino La Prensa, o general Ramón Camps assegurou que essas missões e cursos começaram “sob a direção dos tenentes coronéis Patrice de Naurois e François-Pierre Badie”. Aquelas sessões serviram para transmitir as experiências dos oficiais franceses nas guerras da Indochina e da Argélia. Os documentos existentes provam que esses ensinamentos se baseavam essencialmente nos trabalhos escritos por outro militar francês que confessou a prática da tortura na Argélia, o general Massu. O essencial, porém, foi “ensinado” pelo general Salan e, sobretudo, pelo tenente coronel Roger Trinquier.

Uma nota do general Massu, com data de 19 de março de 1957, argumenta em defesa de um dos princípios aplicados depois pelas ditaduras militares da América do Sul: “não se pode lutar contra a guerra revolucionária e subversiva protagonizada pelo comunismo internacional e seus intermediários com os procedimentos clássicos de combate. É preciso utilizar métodos e ações clandestinas e contrarrevolucionárias. É preciso que esses métodos sejam admitidos com a alma e nossas consciências como necessários e moralmente válidos”. Essa é a parte mais “filosófica” do “combate” contrarrevolucionário. A definição da ação prática corresponde a Trinquier, redator de números manuais militares difundidos na Argentina.

O tenente coronel Trinquier é o “organizador do conceito de guerra moderna”. Essa guerra se articula em torno de três eixos: a clandestinidade, a pressão psicológica e a moralidade estrita. Se se observam os dispositivos técnicos aplicados na Argélia, em seguida pode-se “ler sua tradução” na Argentina, Chile, Uruguai, Paraguai e Brasil. Trinquier inventou um sistema de busca da informação conhecido na França como Destacamentos Operacionais de Proteção (DOP). Esse mesmo sistema foi adotado na Argentina mediante as forças tarefa. O leitor não pode senão assombrar-se com as semelhanças entre os DOP e as forças tarefa. Os DOP tinham a tarefa de interrogar os detidos argelinos e utilizavam a tortura. Eles arrancavam informação sobre a organização político-administrativa dos rebeldes e realizavam a prisão e a eliminação dos suspeitos em lugares ocultos. Essas mãos das sombras que foram as forças tarefa se inspiraram técnica e operacionalmente em todo o aparato repressivo dos DOP franceses.

Na Argélia, Trinquier elaborou a “doutrina da clandestinidade” que mais tarde causaria estragos durante os golpes de Estado na América do Sul: repressão baseada no ocultamento dos centros de detenção, desaparecimento de pessoas e eliminação dos corpos. O recurso a pessoal militar trajado como civis em comandos que percorriam à noite os centros urbanos em busca de vítimas ou de suspeitos para torturar é uma técnica implementada em Argel pelo general Aussaresses e Massu que foi importada para a Argentina por meio das missões de Patrice de Naurois e François-Pierre Badie, Trinquier teorizou por escrito sobre as bases da guerra suja e seus “manuais” se tornaram palavra sagrada nas academias nacionais.

O cronograma das missões francesas à Argentina permite situar com exatidão que foi a ditadura de Onganía a que começou a se alimentar com esses ensinamentos. Um testemunho direto do general Campos demonstra a “irmandade” técnica e moral que existia entre o corpo de oficiais argentinos e os “missionários” que vinham de Paris com a mala repleta de métodos para matar. No mesmo artigo citado anteriormente (4 de janeiro de 1981), Camps declarou, como uma forma de homenagem: “Na Argentina primeiro recebemos a influência francesa, depois a norte-americana. Aplicamos as duas respectivamente de maneira separada e depois conjunta tomando os conceitos de ambas até que a norte-americana predominou. Mas é preciso dizer que a concepção francesa era mais exata que a norte-americana. Esta última se limitava quase exclusivamente ao aspecto militar enquanto a francesa consistia em uma visão global”.

As metodologias se alimentam umas das outras. O general francês Paul Aussaresses foi instrutor militar na base norte-americana de Fort Bragg, Carolina do Norte, a escola dos paraquedistas norte-americanos onde se treinavam as “forças especiais” antes de elas irem para o Vietnã. Um texto ilustrativo escrito pelo coronel francês Henri Grand D’Esnon e destinado exclusivamente às forças armadas argentinas permite compreender como se elaboraram as bases “práticas” para que os generais argentinos incluíssem na vida civil. Gran D’Eson afirma que “a destruição da organização político-administrativa revolucionária corresponde à polícia, mas o exército deve apoiar essa ação toda vez que os métodos da polícia resultarem insuficientes, situação que se produz frequentemente quando a subversão se generaliza” (trecho de “A Guerra Subversiva”, artigo publicado na Revista da Escola Superior de Guerra, nº 338, Julho-Setembro de 1960).

O general Aussaresses reconheceu que ensinou “a tortura e as técnicas de interrogatório da Batalha de Argel” aos militares brasileiros e também norte-americanos. Isso ocorreu na época em que ele era professor em Fort Bragg. Nesse quartel geral dos Estados Unidos, Aussaresses conheceu o coronel Carl Bernard, a quem mostrou um rascunho do livro do coronel Trinquier, “A Guerra Moderna”. Bernard e Aussaresses resumiram o livro e o enviaram a Robert Komer, um agente da CIA que será nomeado conselheiro do presidente norte-americano Lyndon Johnson durante a Guerra do Vietnã. Segundo o coronel Bernard, Komer montou a operação Fênis a partir do resumo do Manuel de Trinquier. A Operação Fênix foi lançada no Vietnã no final dos anos 60: seus métodos são os mesmos que foram empregados depois na Argentina, Chile, Uruguai e Brasil.

Tradução: Marco Aurélio Weissheimer



Junte-se à UJC!


segunda-feira, 23 de julho de 2012

JUVENTUDE COMUNISTA GREGA (KNE) INTERVÉM NO VI CONGRESSO DA UJC




Intervenção do KNE no Seminário Internacional de Solidariedade entre os Povos

VI Congresso da União da Juventude Comunista


Texto: Georgio Eltachir Almarnti – membro da Direção Nacional do KNE
Tradução: Pedro Bras – UJC-RJ

A cada dia que passa temos mais provas e mais elementos que indiquem claramente que a crise capitalista, uma crise de super-acumulação do capital, está se agravando mais e mais na Zona do Euro e na União Européia.

(Não acho que seja necessário fazer um resgate da eclosão da crise capitalista de 4 anos atrás até hoje; Tenho certeza que vocês já leram muito a respeito todos esses anos).

Apenas para apresentar alguns exemplos característicos segundo dados mais atuais: de acordo com as previsões mais correntes a economia italiana irá regredir 2,4% em 2012, enquanto a previsão inicial falava em 1,6%. A Espanha solicitou sua entrada no chamado “Mecanismo de Suporte” da União Européia, seguida pelo Chipre e já há outros a fazer o mesmo (hoje os jornais já especulam que a Croácia está pretendendo o mesmo). Podemos ver muito claramente que o que acontece nos diversos elos da corrente (como Espanha, Itália, França etc.) tem reflexos na corrente como um todo, tem marcante influência em toda Zona do Euro e União Européia.

Também é um fato de que não diz respeito apenas aos países europeus: por exemplo, o que acontece agora na Espanha irá impactar vários países latinoamericanos, que possuem grandes investimentos espanhóis.

Na era do imperialismo, que é a era do capitalismo monopolista, da dominação dos monopólios capitalistas; a ampliada socialização da produção e internacionalização capitalista são fatores para o desenvolvimento de fortes relações de co-dependência dos países capitalistas, muito mais fortes do que costumavam ser há 50 ou 100 anos atrás. Essas relações criam o mundo das contradições intra-capitalistas. O mundo do antagonismo intra-imperialista.

Nos dias 28 e 29 de junho, o resultado do Encontro da União Européia foi um acordo temporário entre as classes burguesas da Europa, com decisões que buscaram reafirmar a posição dos monopólios europeus no quadro do antagonismo global (dando 130 bilhões de euros como um “pacote de desenvolvimento”) e de reafirmar o euro como uma moeda de reserva global.

Mas, esse acordo é apenas temporário:

- (1) porque ele não desfaz (e não pode desfazer) as causas da crise capitalista, o inconstante desenvolvimento capitalista dentro da Zona do Euro e da União Européia.

- (2) porque ele não desfaz a intensificação das contradições intra-imperialistas as quais o capital irá trazer para um dos lados o ônus das perdas e dos danos da crise capitalista.

Os povos da Europa não devem ter nada o que esperar desta briga intra-imperialista. Enquanto a mistura final da política capitalista é “austeridade com desenvolvimento”, ou se é “desenvolvimento com austeridade”, a política dos capitalistas contra a classe trabalhadora e o povo não será nada melhor, nada menos tênue. De um jeito ou de outro, o desenvolvimento capitalista que eles estão dizendo, uma vez mais, será baseado nas ruínas dos direitos e das vidas da classe trabalhadora; na posterior redução do valor da força de trabalho.

Os imperialistas podem brigar entre si. Podem criar novas alianças e contra-alianças, como a chamada “Coalizão do Sul” que se fala hoje na Europa. Mas, eles estão unidos e coordenados quando o assunto é eliminar direitos populares e reprimir movimentos sociais. E quando dizemos que a classe trabalhadora e o povo não têm nada de positivo a esperar desta luta intra-imperialista, não nos esqueçamos que as duas Guerras Mundiais sucederam grandes crises econômicas do capitalismo.

Na Grécia, a profunda crise de super-acumulação do capital, a qual chegou a seu quarto ano combinada com a crise entre os Estados-membros da União Européia, provocou intensa agressividade dos monopólios e de seus representantes políticos, e é expressa pela estrátégia anti-popular como um todo. O acordo que foi assinado entre o governo grego, a União Européia, o Banco Central Europeu (BCE) e o Fundo Monetário Internacional (FMI) são parte dessa estratégia.

Os capitalistas gregos, em conjunto com seus aliados das organizações internacionais capitalistas, planejaram um coordenado programa de maneira a garantir o máximo possível os lucros dos monopólios. As medidas desse programa atacaram os direitos da classe trabalhadora, o valor da força de trabalho: cortes de pensões e salários, cortes nos setores da saúde pública e no sistema de seguridade social, surgimento de todo tipo de relações de trabalho flexíveis, abolição dos contratos coletivos de trabalho, aumento da idade mínima para pensões aos 67 ou até 70 anos de idade.

Ademais, promoveram diversas ações pró-capitalistas, como a redução de impostos para as grandes empresas, estabelecimento de gigantescos subsídios estatais aos monopólios capitalistas com o pretexto de salvar empregos, etc. Especialmente para os jovens trabalhadores, para os filhos da classe trabalhadora, a situação é ainda pior, apenas para citar alguns exemplos: nós temos mais de 1,5 milhão de trabalhadores desempregados em um total de 11 milhões de trabalhadores e a maioria desses desempregados e até mesmo dos sub-empregados são jovens. Seguindo o espírito do “acordo” e do corte geral do salário mínimo de 22%, os salários dos jovens trabalhadores que têm menos de 25 anos de idade foram cortados em 32%.

As duas eleições nacionais na Grécia ocorreram com um mês de diferença (em maio e em junho) sem abrir mão do seguinte contexto: sob as condições de uma crise capitalista prolongada que levou a um imenso aumento da dívida pública, sob condições de um violento ataque contra o valor da força de trabalho. Ao mesmo tempo, segundo fontes oficiais, foi chamada a atenção da possibilidade de uma nova controlada ou incontrolada bancarrota sob condições de um novo aprofundamento da crise capitalista na Europa. Todos esses fatores, em conjunto com a agressividade dos capitalistas e o desemprego em massa, influenciaram o comportamento eleitoral. A luta popular e dos trabalhadores que se desenvolveu durante a crise cultivou uma raiva pública contra os dois maiores partidos da burguesia grega.

Na primeira eleição, o PASOK, o partido social-democrata que enquanto estava como partido da situação implementou a cruel linha política contra os trabalhadores de todos esses anos, sofreu uma grande perda de seu poder eleitoral, de 43% para 13%. O Nea Dimokratia (ND), o partido liberal, também sofreu uma perda de seu poder eleitoral e podemos dizer que o sistema bipartidário como um todo perdeu sua capacidade de enganar as forças populares como fazia no passado.

Isso se mostrou um balanço positivo, mas ao mesmo tempo o sistema capitalista não fica apenas observando, ele intervém com todos os meios possíveis de maneira a colocar obstáculos à resistência popular, precavendo-a de demandas radicais, cultivando a desorientação.
Nenhum governo foi formado após a primeira eleição (e isso foi parte do esforço capitalista de renovar a aparência de seu sistema político. Eles poderiam ter formado um novo governo sem novas eleições, mas eles não queriam que fosse dessa maneira).

Na segunda batalha eleitoral, o critério básico de votação se tornou a necessidade de formar um governo (eles ameaçaram o povo de que a falta de um governo levaria a bancarrota nacional) e a escolha ficou entre o ND e o SYRIZA, o partido oportunista que emergiu como a nova social-democracia na Grécia. Enquanto na primeira eleição expressou-se um positivo aumento de uma tendência a condenar os maiores partidos da burguesia, com uma clara marca contra os acordos com a União Européia e suas políticas, na segunda eleição nós testemunhamos um retrocesso, sob a pressão dos aterrorizantes dilemas e das desilusões em uma solução imediata em favor do povo pelos governos que se conclamam de “esquerda” ou de “centro-esquerda”.

O Partido Comunista da Grécia (KKE) fez um enorme esforço em ambas as eleições, tendo recebido 8,5% dos votos nas eleições de Maio. Na difícil segunda eleição, lutamos com todas as nossas armas contra essa tendência de terrorismo e desilusão. Perdemos boa parte de nosso poder eleitoral, tendo recebido 4,5% dos votos e elegendo 12 membros para o Parlamento, mas nós permanecemos firmes perante nossas convicções, não concedendo ao inimigo ao menos um passo atrás na luta pela causa dos direitos dos trabalhadores, pela causa do socialismo e do comunismo.

As significantes perdas do KKE não refletem o impacto de suas posições e de sua militância. Estas aconteceram sob a pressão das ilusões corriqueiras e da falsa e perigosa “análise racional” do chamado “menos pior”, o doloroso e fácil caminho que defende que é possível formar um governo que administre a crise enquanto permanece dentro do capitalismo e dentro da União Européia e de que tal governo faria por onde para frear a deteriorização das condições de vida do povo.

Ao mesmo tempo, houve o impacto da atmosfera do medo e intimidação sobre a expulsão da Grécia da Zona do Euro. Isso ocorreu em condições de uma sistemática ofensiva “por debaixo dos panos” de mecanismos político-ideológicos do sistema, e até mesmo pelo uso sistemático da internet. O principal objetivo foi o enfraquecimento do KKE de maneira a prevenir o fortalecimento do movimento revindicativo dos trabalhadores sob condições de uma deteriorização das condições populares de vida.

Durante essas eleições foi novamente confirmado a análise que nosso partido vem fazendo desde estopim da crise capitalista: a intensificação dos problemas dos trabalhadores e do povo durante a crise, como o desemprego em massa e a pobreza, não levarão automaticamente a radicalização de sua consciência e de suas ações. Nas condições da crise capitalista sempre há duas possibilidades para o movimento popular: ou ele irá retroceder ante a pressão dos problemas, a diminuição das demandas e expectativas populares, ou ele irá contra-atacar na direção de uma ruptura política com os monopólios e com os partidos da burguesia. Essa batalha entre estas duas possibilidades ainda não cessou. Ainda lutamos contra ela na Grécia e em todo o mundo.

A principal conclusão das batalhas eleitorias ocorridas na Grécia é de que seu resultado como um todo reflete a tendência do retrocesso do radicalismo da classe trabalhadora, que se desenvolveu durante o período de crise, perante a pressão do crescente radicalismo pequeno-burguês, guiado pela ideologia e propaganda burguesas.

Apesar do fato de que nós tivemos várias e importantes batalhas se desenrolando na Grécia após a ecolsão da crise (tivemos mais de 30 greves gerais nacionais nos últimos dois anos e meio, massivas passeatas, ocupações de prédios públicos, denúncia popular massiva do pagamento da dívida etc.), é óbvio que essas batalhas não têm a capacidade suficiente de de aprofundar suficientemente o orientado radicalismo-de-classe, por não levarem a organização popular para a mudança na correlação de forças para além do sindicalismo clientelista, rumo a orientação política que a conjuntura requere.

Essas batalhas foram fortemente influenciadas pelas massas pequeno-burguesas que possuem a tendência de não lutar pela superação do sistema capitalista, mas de lutar para retomar a sua posição histórica no mesmo. Os novos setores da classe trabalhadora que se juntaram a essas batalhas não têm a experiência política necessária para entender a atual conjuntura e procuram por uma maneira diferente de administrar seus ganhos dentro do capitalismo, colocando um fim aos ataques contra si, dando-lhes uma solução imediata.

As políticas governamentais contra o povo foram entendidas pela maioria como um resultado da incapacidade e da corrupção dos políticos, como um resultado de uma posição anti-patriótica dos partidos gregos e não como uma necessidade estratégica da classe burguesa grega e de seus aliados europeus.

Os diferentes setores da burguesia grega tentaram renovar o cenário político do capitalismo (sem mudar obviamente sua essência), bem como previram que os dois partidos burgueses não poderiam controlar a fúria e o descontentamento popular, pois o perigo de manter um sistema político instável era condição necessária para o aprofundamento da crise capitalista.

Ao mesmo tempo nós testemunhamos a direta, provocativa e imprecedente intervenção da Comissão da União Européia na campanha eleitoral através de suas figuras de liderança da Alemanha, França, Itália, FMI, EUA e da mídia internacional.

Apesar da participação da Grécia ser muito pequena dentro do arcabouço da União Européia, sua profunda assimilação à Zona do Euro, sua profunda e prolongada crise combinada com a recessão da Zona do Euro trouxe à tona a intervenção das alianças internacionais por dentro e por fora das ações diretas da União Européia, de maneira a impedir qualquer tendência de radicalização do movimento dos trabalhadores na Grécia, bem como seu impacto internacional.

Um elemento básico da reforma do cenário político é a criação de dois pólos: a “centro-direita” baseada no ND e a “centro-esquerda” com o SYRIZA em participação conjunta de largas seções de quadros do PASOK, os quais preocupam-se com suas responsabilidades criminais a respeito da implementação de uma linha política anti-popular adotada nos anos anteriores.

A burguesia grega prestou bastante atenção à reconstrução da social-democracia grega, pois sabiam muito bem que ela respresenta uma ferramenta básica para o controle dos trabalhadores e dos movimentos populares. Isso é porque, após a falência do tradicional partido da social-democracia, importantes setores dos capitalistas gregos apoiaram o partido SYRIZA, a auto-conclamada “Coalisão da Esquerda Radical”, um partido oportunista que rapidamente se transformou no partido da nova social-democracia da Grécia. É um partido que apoia veementemente a União Européia e a possibilidade de estabelecer mudanças nesta por dentro das próprias instâncias políticas da mesma. Um partido que continua falando sobre sobre os “novos ares” que chegaram a Europa com a eleição de François Hollande na França. Um partido que apresenta as políticas de Barack Obama nos EUA como um exemplo de uma administração política realista da crise em favor do povo!

Esse partido ainda entre as duas eleições abandonou até mesmo seus slogans que pareciam ser mais radicais (como o cancelamento do acordo entre a Grécia, o BCE e o FMI) e ajustou seu programa para as necessidades da administração burguesa. É característico o fato de que a apenas poucos dias antes do segundo pleito eleitoral, o presidente do SYRIZA se reuniu com embaixadores dos países do G-20 em Atenas, de maneira a tentar estabelecer um “clima de confiança” como ele disse!

Ontem estava lendo uma entrevista do presidente do SYRIZA, na qual ele disse estar bastante orgulhoso do fato de seu partido “ser um obstáculo para o conflito incontrolável que estava chegando a Grécia, porque havia se tornado a última esperança do sistema político retomar sua credibilidade”!!!

Com o apoio dos capitalistas para este partido, pela primeira vez na Grécia, antes da decisão do povo grego foi colocada a possibilidade de um chamado “governo de esquerda” dentro do capitalismo, por dentro da União Européia, na medida em que eles aumentaram a pressão para que o KKE participasse em tal governo.

Apesar do fato de que sabemos que haveria um custo eleitoral, nós resistimos a essa proposta, nós revelamos a verdade para o povo. Nós revelamos que a estratégia que promete um futuro melhor para a classe trabalhadora e para os desempregados pelo chamado “de esquerda” ou “governo progressista”, através da manutenção intacta do poder do capital e da propriedade capitalista dos meios de produção, é extremamente perigosa. Essa estratégia vem sendo testada na Europa e em outras partes do mundo e vem se provando extramente falha. Ela levou partidos comunistas a dissolução e ao peleguismo.

Essa estratégia esconde a questão fundamental. Ela esconde que o problema do desemprego e todos os outros principais problemas da classe trabalhadora, não podem ser resolvidos enquanto o poder e a riqueza que a classe trabalhadora produz permanecer nas mãos dos capitalistas, enquanto a anarquia capitalista existir.

As necessidades contemporâneas do povo não podem ser satisfeitas no capitalismo em seu estágio superior, a fase imperialista, e seu total reacionarismo, marcado pelas dificuldades da reprodução do capital, pela competição dos monopólios por sua dominação, pelo reforço do ataque direcionado à redução do valor pago pela força de trabalho e pela crescente taxa de exploração. Mesmo os menores ganhos requerem conflitos muito específicos contra as forças do capital como a heróica greve de sete meses dos mineiros de Aspropigos nos demonstra, a qual foi consistentemente apoiada pelo KKE e pelo PAME em conjunto com milhares de trabalhadores na Grécia e no exterior que expressaram sua solidariedade. A batalha diária pelo direito ao trabalho, pela proteção aos desempregados, pelos salários e pensões, pelo sistema público e gratuito de saúde, pela riqueza nacional e pela educação; a luta diária contra as guerras imperialistas, pelo desmantelamento das organizações imperialistas, pela soberania popular e pelos direitos democráticos estão inexoravelmente ligados à luta pela superação do capitalismo.

O KKE remou contra à maré, como havia feito outras vezes sobre questões políticas cruciais, quando ele expôs, entre outras coisas, o caráter contra-revolucionário dos antigos partidos socialistas, o caráter imperialista da União Européia, quando ele se opôs ao Tratado de Maastricht, quando ele condenou as intervenções imperialistas e os pretextos que as justificaram etc. Ele explanou para o povo o caráter da crise e de suas pré-condições para uma saída em favor dos trabalhadores, pré-condições estas que estão conectadas com o desmantelamento da União Européia e da OTAN, com o cancelamento unilateral da dívida pública, com a socialisação dos monopólios. Ele colocou o governo dos trabalhadores e do poder popular contra o governo da administração burguesa.

O KKE está concentrando todos os seus esforços na criação de uma poderosa aliança sócio-política entre a classe trabalhadora urbana e as camadas populares rurais, as quais lutarão contra todos os problemas do povo; uma aliança que entrará em conflito com os monopólios e o imperialismo e direcionará sua luta pela superação da barbárie capitalista, pela conquista do poder pela classe trabalhadora, com o estabelecimento do poder popular.

A estratégia do KKE está se mostrando acertada pelo desenrolar de todos os dias que passam. Mas, nós não estamos satisfeitos com apenas isto: não é suficiente ter a estratégia correta e o espírito militante apenas. Nós estudamos nossas fraquezas e exercemos a auto-crítica, nos tornando mais efetivos nas questões de vanguarda política, de formação político-ideológica, de aceleração da presença massiva do partido nas fábricas, locais de trabalho, bairros populares, fortalecendo o movimento popular com orientação de classe, promovendo a estratégia socialista sob quaisquer circunstâncias.

O KKE continua sua luta contra todos os problemas que assolam o povo, com um senso cada vez maior de responsabilidade e de decisibilidade. Está focado na luta contra políticas tributárias de caráter anti-popular, contra os acordos coletivos de barganha, a favor dos salários e das pensões, a favor da proteção aos desempregados, pelo sistema público e gratuito de saúde, pela distribuição da riqueza e pela educação popular. Ao mesmo tempo ele prepara suas forças face ao perigo que hoje representa uma guerra imperialista contra a Síria e o Irã.

Especialmente a Juventude Comunista da Grécia (KNE) está concentrando seus esforços para o sucesso das atividades de nossa 38ª edição do Festival da Juventude. Com o slogan “Dê sua mão para quem se levantar... Vocês devem deter o poder!”, nós vamos nos comunicar com centenas de milhares de jovens trabalhadores, desempregados e estudantes por todo o país, e com toda a certeza nós ficariamos muito felizes com a participação da União da Juventude Comunista (UJC) e de todas as organizações que estão aqui presentes no Brasil em nosso festival na cidade de Atenas, em meados de setembro próximo.

Muito obrigado pela atenção!

Cobertura do Congresso da UJC pela TV Memória Latina

domingo, 22 de julho de 2012

"Brasil forjado na ditadura representa Estado de exceção permanente" - Bia Barbosa



Para professores, filósofos e defensores de direitos humanos, o golpe de 64 moldou um país de estruturas autoritárias, que garante direitos apenas para as classes proprietárias e que transformou a exceção em consenso. Em seminário realizado em São Paulo, eles afirmaram que a exceção é o novo modo de governo do capital e que o povo brasileiro vive um momento perigosíssimo de letargia. A reportagem é de Bia Barbosa.



SÃO PAULO - Qual a idéia de "Estado de exceção"? Na interpretação tradicional do termo, trata-se de um momento de suspensão temporária de direitos e garantias constitucionais, decretado pelas autoridades em situações de emergência nacional, ou mediante a instituição de regimes autoritários. Seu oposto seria o Estado de Direito, conduzido por um regime democrático. Na avaliação de professores, filósofos e defensores de direitos humanos, no entanto, a existência de um Estado de exceção dentro do Estado de Direito seria exatamente a característica do Brasil atual, forjada no período da ditadura militar e que, mesmo após a redemocratização do país, não se alterou. Esta foi uma das conclusões do seminário sobre a herança da ditura brasileira nos dias de hoje, promovido pela Cooperativa Paulista de Teatro e pela Kiwi Companhia de Teatro realizado esta semana, em São Paulo.

Para o filósofo Paulo Arantes, professor aposentado do Departamento de Filosofia da USP, há um país que morreu e renasceu de outra maneira depois da ditadura, e que hoje é indiferente ao abismo que se abriu depois do golpe militar e que nunca mais se fechou.

"Que tipo de Estado e sociedade temos depois do corte feito em 64, do limiar sistêmico construído por coisas que parecem normais numa sociedade de classes, mas que não são? O fato da classe dominante brasileira poder se permitir tudo a partir da ditadura militar é algo análogo à explosão de Hiroshima. Depois que a guerra nuclear começa ela não pode mais ser desinventada. Quando, a partir de 64, a elite brasileira branca se permite molhar a mão de sangue, frequentar e financiar uma câmara de tortura, por mais bárbara que tenha sido a história do Brasil, há uma mudança de qualidade neste momento", avalia Arantes.

Para o filósofo, o país foi forjado pela ditadura a ponto de hoje nossa sociedade negligenciar tudo aquilo que foi consenso durante o autoritarismo dos militares. "A ditadura não foi imposta. Ela foi desejada. Leiam os jornais publicados logo após 31 de março de 1964. Todos lançaram manifestos de apoio ao golpe, era algo arrebatador. CNBB, ABI, OAB, todo mundo que hoje é advogado do Estado de Direito apoiou. Se criou um mito de que a sociedade foi vítima de um ato de violência, mas a imensa maioria apoiou o golpe", disse Arantes. "E a ditadura se retirou não porque foi derrotada, mas porque conquistou seus objetivos. A abertura de Geisel foi planejada, já tinha dado certo com o milagre econômico. Tanto que seus ideólogos estão aí, como principais conselheiros econômicos da era Lula-Dilma, e que a ordem militar está toda consolidada na Constituição de 88", criticou.

Na avaliação de Edson Teles, membro da Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos do Brasil e professor de filosofia da Unifesp, a Constituição de 1988 foi apenas uma das formas de lançar o Brasil num Estado de exceção permanente, definido por ele quando a própria norma é usada para suspender a ordem; ou quando aquilo que deveria ser a exceção acaba se tornando ou reafirmando a própria norma.

Para Teles, além de manter a estrutura autoritária militar, o novo ordenamento democrático foi construído sobre o silenciamento dos familiares de vítimas e de movimentos de defesa dos direitos humanos, que queriam justiça para os crimes da ditadura. O problema, no entanto, vinha de antes.

"Em um Congresso controlado pela ditadura, a Lei de Anistia adotou a suspensão da possibilidade de punição de qualquer crime. Um momento ilícito foi tornado lícito, com o silenciamento dos movimentos sociais e pela anistia, que exigiam esclarecimentos sobre os crimes. O que o Estado montou foi algo que manteve a ideia de impunidade. Depois veio o Colégio Eleitoral, que fez uma opção por uma saída negociada entre as oligarquias que saíam e as novas que chegavam, decidindo manter a anista ao crimes da ditadura. Foi o grande acordo do não-esclarecimento", relatou.

O julgamento no Supremo Tribunal Federal em 2010 sobre a interpretação da Lei de Anistia foi, segundo Teles, o coroamento desse silêncio e a instauração de um Estado de exceção no país. "Baseada em ideias fantasmagóricas de que novos golpes que poderiam ser dados, nossa transição foi a criação de um discurso hegemônico de legitimação deste Estado de exceção. Faz-se este discurso como forma de legitimar essa memória do consenso, mas se mantém o Estado de exceção permanente, reconhecendo as vítimas sem nomear os crimes", acrescentou.

Exceção e consenso hoje

O consenso acerca daquilo que deveria ser visto como exceção não se restringe hoje, no entanto, àquilo que pode ser considerado a herança mais direta da ditadura militar. Foi construído também em torno de uma série de acontecimentos e práticas que deveriam mas não mais despertam reações da população brasileira.

"A exceção se torna perigosíssima quando deixamos de reconhecê-la como tal e ela se torna consenso", alertou o escritor e professor de jornalismo da PUC-SP, José Arbex Jr. "Ninguém achou um escândalo, por exemplo, no lançamento da Comissão da Verdade, ver os últimos Presidentes do país juntos, sendo que um deles foi presidente da Arena, o partido da ditadura, responsável pela tortura da própria Dilma; e o outros era Collor! Da mesma forma, está em curso em Osasco uma operação chamada Comboio da Morte, que matou nas últimas horas 16 pessoas. Isso não causa um escândalo nacional, é normal, natural, porque estamos "na democracia". Os jornais falam da Síria, mas a média de mortes diária no auge do conflito da Síria não chega ao que temos aqui cotidianamente. Lá é 60 aqui é 120! Então não estamos discutindo algo que aconteceu em 64 e que hoje se apresenta de forma mitigada, atenuada", disse Arbex.

Para o jornalista, o país vive um estado de letargia hipnótica coletiva, fabricado de maneira competente e eficiente pelo aparato midiático, que produz um consenso em torno de uma imagem de país na qual todos acabamos acreditando. "É muito grave quando olhamos para o Brasil e não percebemos essa realidade de consenso: de nenhuma garantia de direito para quem esteja fora da Casa Grande, e uma situação de guerra permanente", acrescentou.

É o que Paulo Arantes chamou de Estado oligárquico de Direito, um Estado dual, com uma face garantista patrimonial, que funciona para o topo da pirâmide, e uma face punitivista para a base. "Esse Estado bifurcado é uma das "n" consequências da remodelagem do país a partir dos 21 anos de ditadura. Basta pensar no que acontece todos os dias no país. Trata-se de um outro consenso, também sinistro e indiferente, senão hostil, a tudo que nos reúne aqui. Um Estado de exceção que não é o velho golpe de Estado, mas um novo modo de governo do capital na presente conjuntura mundial, que já dura 30 anos", afirmou Arantes.

Ninguém cavalga a história

O que permitiria dizer da possibilidade de se encontrar uma saída deste Estado de exceção permanente é o caráter imprevisível e incontrolável da história. Arbex lembrou que, em setembro de 1989, quando estava em Berlim, ninguém dizia que o Muro cairia menos de dois meses depois. "O fato é que, felizmente, ninguém cavalga a história. Ainda não encontraram uma maneira de domesticá-la. Há um processo latente de explosão social no Brasil, que se combina com processos semelhantes na América Latina, e que pode produzir uma situação totalmente nova. Ninguém previu a Primavera Árabe. Quando um jovem na Tunísia atirou fogo no próprio corpo, ninguém imaginava que, um mês depois, cairia Mubarak no Egito. Estão, não estamos condenados para sempre a esta situação. Só posso dizer que estamos vivendo numa época que, em alguns aspectos, é mais trágica, mais cruel e mortífera que a ditadura militar", acredita.

"Este Estado de exceção só terminará quando a ditadura terminar, quando o último algoz for processado e julgado. Se a Comissão da Verdade encontrar dois ou três bons casos e levantar material para ações cíveis, pode haver uma transmutação disso tudo. E o regime, a sociedade e a economia não vão cair se os perpetradores da ditadura forem processados, como não caíram na Argentina ou no Chile", acredita Paulo Arantes. "Mas devemos pensar no que significaria essa última reparação. Se o último torturador e os últimos desaparecidos forem localizados, em que estágio histórico vamos poder entrar?", questionou. Uma pergunta ainda sem resposta.