quinta-feira, 19 de março de 2009

Sobreviver e resistir à ocupação, a difícil rotina dos palestinos


Por Adriana Mabilia (*)


Em frente, um assentamento ilegal que começou a ser construído há 7 anos abriga hoje por volta de 6 mil famílias israelenses. As obras em andamento indicam a expansão do lugar. O muro de 8 metros de altura e 790 quilômetros de extensão ainda não chegou à colônia, mas à esquerda já é possível vê-lo. Esta é a vista da janela do quarto do hotel onde estou hospedada em Belém, na Palestina.


A quinhentos metros do hotel, um dos 700 checkpoints que se espalham pelo interior da Cisjordânia. É o pedágio que dá acesso a Jerusalém. Só passam por ele os poucos palestinos que têm permissão especial concedida pelo governo israelense: doentes que se submetem a tratamento em Israel; os que têm emprego em Israel e outros casos raros e específicos. Cruzar checkpoints é uma rotina diária de constrangimentos e assédio moral. Os palestinos devem apresentar identidade, têm bolsas e sacolas vistoriadas, passam por interrogatório e, às vezes, são retidos para averiguação. Tudo sem explicação ou satisfação.


Do outro lado de Belém, a 20 minutos do hotel, fica outro checkpoint movimentado, o que dá acesso a Ramalah, capital administrativa da Cisjordânia. Apesar de se tratar de limites entre duas cidades palestinas (Belém e Ramalah), o exército de Israel também controla a passagem.

O cerco está se fechando. Wisam, que vive no vilarejo de Wadi Fukin, diz que Israel cria dificuldades novas, a cada dia, para que os palestinos desistam e abandonem suas terras. “Quando os israelenses percebem que nós nos adaptamos, eles dão um jeito de impor novas regras e de criar novos impedimentos para que a vida aqui se torne ainda mais insustentável. A pressão não parte só dos soldados, do governo. Os colonos que moram ilegalmente nas nossas terras também querem nos expulsar. Aqui, em Wadi Fukin, eles despejam água de esgoto na nossa plantação. Tivemos que deixar de cultivar parte da terra fértil por causa disso. Eles têm encanamento, mas desviam a tubulação só para nos prejudicar. Querem que os poucos palestinos que ainda restam em Wadi Fukim desistam e vão embora para viver por aí como refugiados”.


Os moradores de Wadi Fukim também estão preocupados com a chegada do muro na região. Amim conta que Israel está construindo um túnel que ligará o vilarejo a Belém. “Israel toma as nossas terras e nos impede de transitar por elas. Estamos sem terra para plantar, sem emprego e confinados entre muros e túneis controlados pelo exército”.


Com a construção do muro, os palestinos passam a viver em 11% dos 22% dos territórios que restaram aos árabes depois da guerra dos Seis Dias, em 1967. O fato de o muro estar sendo construído em grande parte dentro de território palestino desmente o argumento israelense de que o paredão se faz necessário para garantir a segurança do Estado judeu e reforça a tese da Autoridade Palestina que acusa Israel de ocupar ainda mais terras.


Apesar das restrições, da falta de emprego, das condições precárias do sistema de saúde, das privações impostas, mais de 4 milhões de palestinos resistem e permanecem nos territórios ocupados. Alguns por falta de opção, a maioria por acreditar na justiça da causa palestina.


Nadia, diretora de uma organização não-governamental para mulheres e militante do Partido do Povo da Palestina, diz que a força e o amor à terra são passados de geração para geração: “Os meus pais, o meu marido e eu, e agora os meus filhos, três gerações que sofrem com a ocupação. E continuamos aqui, lutando, sempre de maneira pacífica. Uma hora isso vai acabar. Não há império que não tenha fim. A história mostra isso e nos dá ânimo para seguir em frente”.


As manifestações contra a ocupação são também injeções de ânimo para os palestinos. Eles se reúnem, se integram e renovam os votos pela resistência. Acompanhei uma dessas demonstrações. Havia cerca de 60 pessoas e um grupo de 6 jovens israelenses que militam pela paz. Quinze soldados observavam a movimentação. Tudo acontece a menos de meio metro dos militares, apenas uma cerca de arame separava os manifestantes dos soldados.


A manifestação começa com discursos dos líderes. Depois, militantes fazem os gritos de paz contra o muro e pelo fim da ocupação. Do megafone, o som ecoa, as pessoas gritam, repetem o coro, pulam, se abraçam, dão as mãos. Num dado momento, os soldados empurraram o arame para afastar os manifestantes, alguns rapazes se feriram, cortaram a mão, mas ninguém arredou pé. É, de fato, um momento de renovação, de perpetuação da fé no fim da ocupação.


* Adriana Mabilia, jornalista, especialista em Oriente Médio.

Nenhum comentário:

Postar um comentário