sexta-feira, 12 de junho de 2009

A tragédia da GM: O sistema revida - por Rick Wolff [*]


Cartoon de Patrick Chapatte.











A maior tragédia entre as muitas do colapso e bancarrota da General Motors refere-se ao que não está a acontecer. Há soluções para os problemas da GM que não estão a ser consideradas pela administração de Obama. Há as soluções que não estão a ser reivindicadas pela United Auto Workers Union (UAW). Há todas as soluções que não não estão a ter a atenção que merecem.

Vamos começar com um exemplo desta última. Durante 50 anos, o mercado mundial para automóveis cresceu espectacularmente. A companhia melhor posicionada para aproveitar aquela maré ascendente era a GM, a líder do mercado global durante a maior parte desse período. Ao invés disso, a GM fracassou catastroficamente. Aqueles responsáveis, que planearam, coordenaram e competiram fracamente, têm um nome. Eles são o Conselho de Administração da corporação: o punhado de indivíduos escolhidos pelos e responsáveis perante o punhado de grandes accionistas da GM. Aquele Conselho de Administração demonstrou ao longo de décadas que não dispunha de entendimento, visão e flexibilidade para ter êxito. A subida da maré é suposta levantar todos os barcos, mas o capitão da GM conseguiu afundar o seu barco.

O presidente Obama prometeu não interferir nas decisões do próximo Conselho de Administração da GM pós-bancarrota apesar de o governo ser o maior accionista da empresa. Ele mais uma vez prometeu vender rapidamente as acções do governo para "reprivatizar" a GM (e promete o mesmo para bancos, companhias de seguros e outras corporações que entraram em colapso e foram ressuscitadas por infusões de dinheiro do contribuinte). O plano de Obama devolve a tomada de decisões aos mesmos Conselhos de Administração que acabaram de provocar o pior crash económico em 75 anos.

A bancarrota da GM cortou empregados bem como salários e benefícios dos trabalhadores remanescentes. Isto mais uma vez prejudicará os já cambaleantes estados do Meio Oeste, dependentes da indústria automobilística. Se a nossa cultura fosse menos subserviente aos interesses e mentalidades capitalistas, o governo teria desenvolvido – anos atrás, mas certamente durante o ano passado assolado pela crise – grandes planos para manter o emprego e a economia regional através da conversão de fábricas automobilísticas encerradas em, por exemplo, produção de sistemas de transportes em massa ecologicamente sensíveis. Esta seria uma indústria em crescimento pois muitas regiões procuram reduzir o dano ecológico provocado pelos sistemas de transporte baseados no automóvel privado. Os apoiantes de Obama conversam acerca dessas coisas, mas a sua administração não as faz.

O governo poderia igualmente ter desenvolvido programas para utilizar fábricas encerradas, armazéns e salas de exposição para ajudar trabalhadores despedidos a organizarem e operarem as suas próprias empresas. Por uma minúscula fracção dos milhares de milhões dados aos bancos, o governo poderia financiar tais trabalhadores a utilizarem as suas qualificações, as suas grandemente inexploradas capacidades administrativas e o seu conhecimento das necessidades locais bem como o seu compromisso para com elas. Isto, também, não está a acontecer.

A UAW não teve dúvida em aceitar os termos horríveis do plano de bancarrota da GM de Obama porque caso contrário a bancarrota era uma ameaça ainda pior para trabalhadores. Foi "o melhor acordo possível nas circunstâncias". Contudo, aquelas circunstâncias poderiam ter sido diferentes se a UAW e os seus aliado houvessem começado a combater por eles mais cedo. Suponha-se, por exemplo, que a UAW, outros sindicatos e a esquerda política houvesse combatido e aprovado leis que obrigassem o governo a financiar investimentos maciços em novas empresas (produzindo coisas novas e organizadas de novas maneiras) sempre que capitalistas privados efectuassem despedimentos colectivos de trabalhadores em grande número. Nesse caso a UAW não teria tido de aceitar a espécie de acordo horroroso que Obama e a GM acabam de empurrar sobre eles. Os trabalhadores da UAW teria recusado porque teriam sabido que o governo era obrigado a proporcionar-lhes novos empregos, empresas e novos apoios se fossem despedidos com a bancarrota da GM. Os custos do governo com o salvamento da GM através da bancarrota teriam tido de incluir as despesas de proporcionar os novos empregos e apoios aos trabalhadores despedidos. O governo podia então ter feito forte pressão sobre a GM por um salvamento com muito menos empregos perdidos. Em qualquer caso, se tais leis tivessem sido aprovadas, os membros da UAW despedidos numa bancarrota não enfrentariam o desemprego nem as suas comunidades enfrentaria a devastação agora a caminho.

A questão é que nada na tragédia Obama-GM era necessário ou inevitável. As lutas políticas não travadas e as leis não aprovadas criaram as circunstâncias que levaram a UAW a capitular à bancarrota de Obama como opção menos penosa. Os apologistas automáticos do status quo estão errados na sua recusa a falar do que poderia ter acontecido. O que pode ter sido – mas não venceu ou mesmo nem se combateu por isso – determina os sofrimentos em massa de hoje à medida que a tragédia da GM se desdobra. Sem alianças passadas trabalho-esquerda a lutarem por leis tais como as que o exemplo acima descreve, o caminho estava limpo para a GM e Washington conceberem uma opção para a UAW que tornou os seus membros perdedores de qualquer maneira.

A GM jogava de acordo com as regras do sistema capitalista. Primeiro, ela sempre procurou lucrar tratando os seus empregados tão duramente quanto possível e pagando-lhes tão pouco quanto podia. Segundo, a GM assegurou o mercado dos EUA para os seus carros e camiões ao bloquear o desenvolvimento de transporte em massa de alta qualidade no país. Os trabalhadores da indústria automobilística combateram, através da UAW, e acabaram por ganhar salários e benefícios decentes que se tornaram objectivos para todos os outros sindicatos e trabalhadores durante décadas. Os esforços dos cidadãos dos EUA para obter transporte em massa de qualidade fracassaram (daí os sistemas de transporte em massa muito superiores da Europa).

Sob a regras do capitalismo, salários decentes e condições de trabalho conquistadas pela UAW levaram a GM a revidar levando a produção para onde os salários e os benefícios fossem mais baixos. Portanto, a produção de veículos da GM dentro dos EUA atingiu o pico no fim da década de 1970 (mais de 6 milhões) e desde então caiu constantemente (mais de 2 milhões em 2008). A GM lucrava mais com o trabalho muito mais barato na China, Brasil, Índia e alhures . Os grandes perdedores foram as centenas de milhares de despedidos, os aposentados, os poucos trabalhadores ainda empregados na indústria automobilística e toda a gente em Detroit e todas as outras comunidades devastadas em consequência. A bancarrota da GM desta semana cria ainda mais perdedores a fim de "reconstruir a lucratividade da GM".

Trabalhadores que têm êxito na luta por salários e condições de trabalho decentes acabam sempre por descobrir que o sistema revida. É assim que o capitalismo funciona, como os capitalistas lucram. Os republicanos e os sósias democratas servem orgulhosamente tal sistema. E a lição para os trabalhadores da GM e demais é .........?
estão a ser discutidas pela maior parte dos comentadores de esquerda acerca do desastre. Finalmente, há aspectos cruciais da morte da GM que

[*] Professor de Economia na Universidade de Massachusetts – Amherst. Autor de muitos livros e artigos , incluíndo (c/ Stephen Resnick) Class Theory and History: Capitalism and Communism in the USSR (Routledge, 2002) e (c/ Stephen Resnick) New Departures in Marxian Theory (Routledge, 2006). Acerca da crise económica actual ver o seu filme documentário Capitalism Hits the Fan, em www.capitalismhitsthefan.com .

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .

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